Leitura de imagens

Arcimboldo, Giuseppe

"O Verão"

Visto de perto, este quadro parece ser um sonho de um vendedor de fruta. Ao afastarmo-nos, uma cabeça humana começa a tomar forma. Ele foi feito, na sua totalidade, com base nos frutos e vegetais do Verão. Embora conhecido por usar frequentemente frutos e legumes para criar os seus retratos, Arcimboldo costumava também usar potes, panelas e até ferramentas na criação das suas estranhas imagens. As suas obras mais importantes foram pintadas em Praga, onde esteve ao serviço de alguns dos Habsburgos. Arcimboldo estava incumbido de outros trabalhos para a corte – fazer as decorações para as festividades, adquirir peças de arte para a colecção do Imperador e desenhar e construir fontanários. As pinturas de Arcimboldo eram de alguma forma tidas como ridículas, embora fossem imitadas. Foi apenas quando os surrealistas viram nele um amante dos jogos visuais e, logo, um dos seus, que Arcimboldo se tornou famoso.

Baldung, Hans

"A Morte e a Donzela"

Estas quatro figuras constituem uma alegoria das três idades do homem. A morte é representada por um esqueleto que segura uma ampulheta. À sua volta vêem-se um bebé que dorme (a infância), uma rapariga (a juventude) e uma velha desfigurada pela magreza (velhice). Baldung era um desenhador fecundo, e o realismo dos corpos neste quadro revela que observou atentamente o corpo humano. À semelhança do seu mestre Albrecht Dürer, Baldung não se dedicou só à pintura; para além de muitas gravuras fantásticas, deixou-nos desenhos para vitrais e uma extensa obra gráfica. Tal como Hieronymus Bosch, Baldung expressou o terror e sofrimento do seu tempo recorrendo à fantasia. Uma das mais importantes obras de Baldung é o retábulo do altar da catedral de Friburgo, que data de 1516. Morreu em Estrasburgo, sendo então um abastado e influente membro da sociedade.


Bellmer, Hans

"As Voltas do Pião"

Uma forma de mulher-quase-esqueleto rodopia sobre um pião que segura na mão ossuda. Esta figura peculiar que gira em torno de si própria, desafiando as leis da gravidade, simboliza a mulher que faz o coração e a cabeça dos homens andar às voltas. Originalmente concebida entre 1936 e 1939 para o projecto de uma escultura que não chegou a ser concretizada, esta é decerto uma das imagens mais perturbadoras de Bellmer. Nascido na Polónia, Bellmer tornou-se um surrealista activo ao mudar-se para Paris em 1938. Esta obra reflecte muitas das preocupações daquele movimento – a sua imagética distorcida e fantasmagórica parece saída directamente das fantasias subconscientes do artista. O tema central de Bellmer era o corpo feminino, muitas vezes tratado de uma forma obsessivamente erótica. Da sua obra destacam-se as perturbadoras «Bonecas» fetiches, uma série de modelos articulados arbitrariamente deformados, e os desenhos e litografias, executados com uma precisão técnica excelente.


De Chirico, Giorgio

"A Inconstância do Poeta"

Um amontoado de bananas e um torso feminino clássico estão dispostos defronte de uma arcada. O horizonte é definido por uma parede. Por trás desta, um comboio quase indistinto afasta-se, ao longe. Tal colecção de objectos pode parecer arbitrária e ilógica, mas cada um deles tem um significado simbólico: o torso simboliza uma presença humana; as bananas, o exotismo; o comboio, a viagem. Os contornos de toda esta imagética estranha foram delineados com vigor. No entanto, são as sombras, monumentais e ameaçadoras, que ao invadirem toda a pintura lhe conferem poder e mistério. Giorgio de Chirico e Carlo Carrà deram origem a uma tendência, a Pintura Metafísica (Pintura Metafísica), associada a imagens e atmosferas oníricas e misteriosas. As obras enigmáticas e fantásticas deste autor influenciaram os surrealistas do seu tempo. No entanto, a partir de 1925, ele viria a adoptar um estilo mais tradicional.

Claesz, Pieter

"Natureza-Morta/Vanitas"

Um crânio humano domina este estranho arranjo de objectos. Banhados por um raio de sol que os percorre, foram pintados em pálidas tonalidades de castanho. O artista notabilizou-se na Holanda com naturezas-mortas como esta, quase monocromáticas, que conferiam uma sensação de harmonia, mística aos objectos que representavam. O tema desta obra (Vanitas, termo que designa igualmente o subgénero a que pertence) é o carácter transitório da vida terrena: o crânio representa a morte; o copo virado simboliza a vida que se dissipa; o relógio lembra-nos o tempo que passa. Os pintores holandeses do século XVII gostavam de representar os objectos do quotidiano. Estas obras não tinham um tom abertamente moralizador, mas eram muitas vezes ricas em significados simbólicos que seriam rapidamente apreendidos naquela época. Hoje em dia, estas obras são mais admiradas pelo virtuosismo absoluto que encerram.


Dali, Salvador

"O Sono"

Nesta fantástica interpretação do sono, vê-se apenas uma cabeça, de um ser adormecido, contra um fundo de imagens fantásticas. O equilíbrio delicado da figura é tal que sabemos que, se apenas um dos suportes caísse, a cabeça acordaria; assim se demonstra a fragilidade do sono. A meticulosa atenção de Dali ao pormenor cria uma atmosfera de acentuada hiper-realidade. Como membro do Movimento Surrealista, Dali promoveu o conceito de absurdo e o papel do inconsciente na sua arte. Dali colaborou também com o realizador Luís Bunuel em filmes como Un Chien Andalou e L’ Age d’Or, que são ainda hoje considerados marcos da história do cinema. Embora provocasse a indignação pública, a sua celebridade e o contributo para a arte são inegáveis. Tendo trabalhado em Paris e Nova Iorque, Dali regressou à sua Espanha natal em 1955, onde se instalou com a sua companheira Gala, de quem pintou muitos retratos.



Davis, Stuart

"Batedeira de Ovos N.º 4"

Esta obra combina cores e elementos ambíguos num jogo entre forma, linha e profundidade. Os elementos foram cristalizados num todo abstracto, cuja unidade é assegurada através dos blocos de cor mate e formas precisas. Estas partes, em interacção, convidam o olhar a correr a tela, seguindo os movimentos angulares da batedeira. Grande parte da obra do autor revela a influência das formas fragmentadas dos cubistas, embora Davis as tivesse desenvolvido através do humor, da vivacidade e da sonoridade excêntrica do jazz, de que era apaixonado. Pintada em 1927 e 1928, a série Batedeiras de Ovos baseou-se nas formas de uma batedeira, de uma ventoinha e de um par de luvas de borracha e trouxe a público as primeiras composições abstractas a serem criadas por um artista no espaço de uma década. Davis usou como tema a vida contemporânea americana, pintando tudo, de bombas de gasolina a paisagens.



Lam, Wilfredo

"A Selva"

Reunido na orla de uma selva, com a qual os seus membros longos e finos parecem confundir-se, encontra-se um grupo de estranhas criaturas saídas da imaginação de Lam. O mistério da selva está reflectido nestas extraordinárias feras que habitam nas suas profundezas impenetráveis: animais esverdeados com formas vagas, estranhas, e cabeças tribais, saídas de sonhos alucinatórios. Neste quadro, o mais conhecido dos seus trabalhos, Lam reuniu muitos elementos – africanos, latino-americanos e da Oceânia – fundindo-se com as convenções do Movimento Moderno europeu. O autor representou muitas vezes cenas de voodoo, folclore, tótemes e selvas – transmitindo um estranho sentimento de «frutos proibidos». De origem cubana, esteve em determinada altura ligado aos surrealistas. Tanto Lam como o seu amigo Pablo Picasso foram influenciados pela escultura africana e da Oceânia.



Nash, Paul

"Mar Morto"

Esta imagem terrífica de um vasto e estático mar de destroços metálicos é uma transformação imaginativa e visionária de uma série de fotografias tiradas pelo artista numa sucata de aviões alemães perto de Oxford. Asas, rodas e fuselagens são discerníveis nesta massa de peças de metal. Um luar sombrio envolve toda a cena e evoca uma estranha atmosfera de morte e destruição. Trata-se de um dos registos mais convincentes de Nash como artista oficial de guerra do Ministério do Ar durante a II Guerra Mundial, captando as tragédias e os triunfos daqueles anos amargamente vitoriosos. Embora influenciado pelo Surrealismo, Nash permaneceu essencialmente um artista de paisagens visionárias. O conteúdo dramático das suas obras é por vezes associado ao Neo-Romantismo, tendência com estilo de pintura muito teatral e romântico. O seu trabalho incluiu gravuras, ilustrações de livros, desenho industrial e fotografia.



Picasso, Pablo

"Mulher a Chorar"

O profundo desgosto desta mulher desesperada é reflectido com grande intensidade nas cores fortes e nas pinceladas rígidas desta pintura. A atenção do observador é imediatamente dirigida para o azul frio e para a área branca à volta da boca e dos dentes da mulher; os olhos e a testa estão deslocados – literalmente destroçados pelo desgosto. A figura lembra as da monumental pintura de Picasso, Guernica, realizada no mesmo ano, que retrata o massacre de mulheres e crianças durante a Guerra Civil de Espanha. A pintura aqui mostrada é um dos exemplos mais expressivos de uma série de Picasso intitulada Mulheres a Chorar. A forma como a face da mulher foi distorcida e fragmentada constitui um desenvolvimento das ideias do Cubismo que Picasso, juntamente com Braque, fundou. Nascido em Espanha, Picasso foi para Paris em 1901 e passou o resto da sua vida em França. É considerado o maior artista do século XX.



Severini, Gino

"Pierrot, o Músico"

Pierrot, o músico, vestido com um fato imaculadamente branco que contrasta com a mascarilha preta da commedia dell’arte, está sentado numa sala cujas paredes têm um padrão colorido. Em 1910, Severini juntou-se ao Movimento Futurista, iniciado por um grupo de artistas e escritores que exprimiam o dinamismo do mundo moderno pintando máquinas e figuras em movimento, assim criando algumas obras-primas da arte futurista. Foi muito influenciado por Georges Seurat, como demonstra o uso que faz da cor pura, e tornou-se amigo de alguns artistas cubistas, incluindo Pablo Picasso. A calma deste quadro e a precisão e cuidado com que Severini executou as pregas rígidas do fato do Pierrot, as mãos rugosas e a guitarra marcam o ponto de afastamento do artista dos movimentos futurista e cubista, em direcção a um espírito neoclassicista que dominou a sua obra até morrer.



Tanguy, Yves

"Os Invisíveis"

As sombras abstractas e biomórficas trepam sobre objectos que parecem sabres as flutuar em direcção a um céu nebuloso e ameaçador. Tanguy foi muito influenciado por de Chirico e juntou-se ao Movimento Surrealista depois de ter conhecido o escritor e «guru» surrealista André Breton, em 1925. O título e o tema deste quadro fazem referência à ideia de Breton quanto à existência de animais invisíveis que escaparam ao domínio dos sentidos dos homens através de uma particular camuflagem. A qualidade visionária do quadro é uma ilustração clara do imaginário surrealista: Tanguy permitiu ao seu subconsciente que «criasse» estes seres. Este é um tema comum em muitas das suas obras surrealistas, onde criaturas amorfas aparecem a povoar as paisagens alucinatórias da mente. A precisão e a clareza estavam muito enraizadas na sua personalidade, e estas qualidades são também evidentes nos seus quadros.



Wadsworth, Edward

"A Praia"

Alguns objectos náuticos estão reunidos no primeiro plano do quadro, contra um fundo de céu, mar e areia. O quadro mostra a habilidade técnica e a precisão de Wadsworth: os mais pequenos pormenores são pintados com uma minúcia espantosa e a difícil técnica da têmpera de ovo (preparada por ele próprio) é utilizada com perfeição. O imaginário destas fantásticas criações geométricas confere maior prazer intelectual do que a maioria das naturezas mortas. O quadro aproxima-se do Surrealismo graças às justaposições inesperadas e à claridade hiper-realista. Durante a I Grande Guerra, Wadsworth alistou-se na Royal Navy, onde desenhou e pintou camuflagens para os navios. Este episódio da sua vida fez com que se apaixonasse pelo mar e pelos navios, temas recorrentes da sua obra. Além dos quadros e das gravuras, Wadsworth também pintou murais, nomeadamente para o paquete Queen Mary.
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Retirado de O Livro da Arte, da Texto Editora

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