ARQUIPÉLAGO DAS PALAVRAS

HÁ PALAVRAS QUE NOS DESPEM POR DENTRO QUANDO NOS VESTIMOS DE LAVADO


JOÃO LOBO ANTUNES

Neurocirurgião

“Na educação continuamos muito abaixo da qualidade necessária para o País, e está a perder-se tempo — que não é um tempo real, são anos-luz — em termos de procurar soluções. É uma doença crónica que já aflige a nossa Educação. Acresce que é no ensino secundário que se molda, em grande parte, aquilo que os rapazes e raparigas vêm a ser no exercício da cidadania, nas qualidades de trabalho, de exigência, de disciplina.

“ Mesmo para quem exerce uma profissão técnico-científica como é a minha, a História, a Filosofia e o Português são fundamentais. Tenho participado em sessões para tentar salvar a Filosofia do currículo. Faço-o com gosto porque a formação filosófica — «a capacidade de ver para lá da aparência das coisas», como dizia Fernando Gil — é fundamental. E repare como muito deste debate da Educação se fica pela aparência das coisas... Reduzir a Filosofia a uma inanidade cinzenta é um crime. O problema é que esses crimes são como alguns efeitos de estufa intelectual, em que só vemos as consequências anos depois.

“Repare como essa frase [«Li muito, li tudo para o que desse e viesse», de Vitorino Nemésio] contraria a teorização da pedagogia moderna, em que querem objectivos, comportamentos, programas, axiomas como «só se pode ensinar aquilo que pode ser avaliado». Perde-se o valor da Educação na perspectiva nemesiana — o saber livre, o saber gratuito, o saber por saber — e fica-se nesta história de saber porque vão perguntar-me para ver se sei.

Excertos da entrevista dada à revista Visão (27 de Março de 2008)

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