ARQUIPÉLAGO DAS
PALAVRAS
ELEVAR-SE ATÉ AO CHÃO
PALAVRAS
ELEVAR-SE ATÉ AO CHÃO
António Carlos Cortez
Poeta e professor de Português
Indisciplina e Violência
“(...) no nosso país se formalizou a ideia de que é a Escola em geral, e os professores em particular, quem deve educar e formar as gerações. (...)
Ora, se é a Escola que substitui as famílias, tal significa que um dos pólos do sistema educativo não funciona ou pura e simplesmente não existe. Se a família não existe, se os pais se demitem ou não sabem exercer o seu papel, isso significa que o problema da educação em Portugal não se resolve com medidas de circunstância (...)”.
Ora, se é a Escola que substitui as famílias, tal significa que um dos pólos do sistema educativo não funciona ou pura e simplesmente não existe. Se a família não existe, se os pais se demitem ou não sabem exercer o seu papel, isso significa que o problema da educação em Portugal não se resolve com medidas de circunstância (...)”.
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“Julgo que uma das causas fundamentais deste nosso «romantismo torpe» (...) se prende com a estrutural ausência nas famílias portuguesas — no povo, mesmo — do valor do saber, ou melhor, da formação da criança com vista às aprendizagens sociais.”
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“A verdade é que (...) a maioria dos pais não fala normalmente com os seus filhos: artificializa a relação ou por meio dum discurso infantil, em que impera o excesso de mimo, ou, mais tarde, através da mais leviana concepção de liberdade, quase sempre considerando os pais que são eles (...) o «melhor amigo» da sua filha ou filho.”
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“O resultado é quase sempre desastroso: perdida a noção de autoridade (não confundir com autoritarismo, veja-se) e perdido o sentimento de fronteira que deriva duma maior experiência de vida e um grau de interpretação do mundo que deveria ser maduro e consequente relativamente aos pais, já os filhos não podem ver nas figuras paterna e materna senão os veículos para o prazer. Hedonistas, o dinheiro transforma-se — o dinheiro e não outra coisa — no melhor amigo dos filhos.”
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“Queixam-se de que a Escola não motiva os seus filhos. Terão razão. Mas é difícil, senão impossível, motivar quem esteja alienado, quem jamais tenha lido um livro ou falado com os pais sobre cultura portuguesa, História de Portugal ou sobre os mais simples factos sociais.
Não é possível também motivarmos os nossos alunos quando, sejamos verdadeiros, as sucessivas reformas educativas visam o facilitismo, os resultados estatísticos, a superficialidade nas aprendizagens.”
Não é possível também motivarmos os nossos alunos quando, sejamos verdadeiros, as sucessivas reformas educativas visam o facilitismo, os resultados estatísticos, a superficialidade nas aprendizagens.”
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“Hoje os nossos alunos são apáticos, amorfos, ignorantes, inconscientes, violentos? Não admira. É amorfa e apática a nossa sociedade; é ignorante a comunidade em que vivemos; são inconscientes as acções que se tomam (falta-nos bom senso) e é violenta a sociedade de imagens em que vegetamos.”
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“Tal estado da arte encontra responsabilidades directas nos sucessivos governos que entendem que são os sociólogos da educação e as ciências desse ramo os detentores de uma fórmula mágica, a mais das vezes desfasada da realidade educativa, com profissionais fechados nos seus gabinetes de especialistas, sem jamais terem pisado uma escola ou conversado, sem complexos, com os nossos adolescentes.”
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“A escola não é, como referem os media, o lugar diabolizado da nossa sociedade. A escola, através do trabalho ideológico que as televisões vão fazendo, funciona como bode expiatório da crise educativa, que é, bem vistas as coisas, uma crise histórica, uma crise mental. Sem professores motivados para o exercício da pedagogia; sem docentes investigadores, permanentemente actualizados, críticos (com conhecimentos básicos de Filosofia, História, Língua e Literatura...), não é possível motivar quem quer que seja.”
Excertos do texto “Indisciplina e violência, Um caso mental”, publicado no Jornal de Letras (20 de Maio de 2008).
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